Eu já escrevi alguma coisinha sobre o assunto na resenha de Ligue os Pontos, do Gregorio Duvivier, que ainda não está no site. Basicamente disse que não sou atraído a ler algo porque o escritor é famoso (a não ser, claro, que o cara seja famoso por ser escritor), e spoiler: eu não gostei do livro do Gregorio. Fora isso, eu não vejo nenhum canal cujos donos lançaram livros, o único que eu via era o da Jout Jout, mas parei por motivos desconhecidos por mim mesmo. Então, para ficar bem claro, eu tenho zero relações com qualquer um desses caras.
Já vi muita, mas muita gente falando sobre, mas eu mesmo não li nenhum, pelo menos não no estilo que o pessoal mais fala mal, que é esse estilo autobiográfico/autoajuda (sim, autoajuda, não mintam para vocês mesmos). Agora que vocês já sabem todos os fatos sobre a minha pessoa em relação a esse caso, vamos as minhas considerações.
1° - Eu nunca vou ler um livro desses. Atualmente eu tenho 90 livros para ler em casa, então eu não vou perder tempo com esse tipo de obra de gente que eu nem gosto. Muitos dos youtubers desse monte eu tenho uma aversão forte na verdade, mas não vou dizer quem.
2° - Se eu fosse um editor, primeiro que eu seria chato para caralho, e segundo que eu não publicaria nada só para dar dinheiro (sim, eu sou um romântico, bem desiludido, mas um romântico) e sim só o que eu gostaria, então eu não pegaria nenhuma imagem desse povo para ganhar grana.
3° - Eu disse imagem porque é esse o real produto que está sendo vendido, e não o que está escrito, tanto até que vários deles não escreveram o negócio. Então se não fossem livros, e sim camisas, quadrinhos, canecas, filmes, qualquer coisa, não faria a menor diferença.
4° - Eu odeio todos por terem envolvido a literatura e queimaria tudo? Não. Eu entendo totalmente que é uma tendência do mercado para lucrar e que daqui a pouco isso vai acabar, assim como todas as outras modas. É bom vocês saberem também que em todo lugar existe isso, e alguns estrangeiros até saíram aqui, como o PewDiePie, então não achem que “só acontece no Brasil”.
5° - Uma coisa que muita gente diz e que me deixa puto é “se não fosse por esses livros, aquele autor brasileiro que você adora nunca teria lançado nada”. Primeiro que isso não faz nem sentido, porque o tal autor geralmente JÁ lançou livros, então ele não dependeu dos youtubers para nada; segundo que a moda passa, mas ele fica, quando não fica pelo resto da existência humana; e terceiro, as editoras que se propõem a lançar esse cara sabem que ele não vai vender, mas venda não é o único jeito de ganhar dinheiro no mundo da literatura, embora seja o que deixa as pessoas mais ricas. Existem prêmios, contratos para escrever em jornais/blogs/TV/cinema, listas de melhores do ano, lista de obrigatórios da faculdade que gostam de botar escritores atuais, e, principalmente, venda contínua ao longo do tempo, o que os youtubers com certeza não conseguirão fazer.
6° - Essa vai ser provavelmente a mais polêmica, mas eu tenho que dizer né. Primeiro é que eu não acredito nesse papo de que pode-se ler qualquer livro desde que leia, porque pode ser que você não goste de passar o olho em páginas, mas veja um cinema complexo com engajamento social e forte cunho filosófico, e por isso as pessoas que lêem apenas para se divertir não poderiam falar que são mais inteligentes só porque lêem. Segundo é que às vezes a pessoa que só lê a literatura mais popular acha que está lendo a coisa mais inteligente do mundo, e eu acho isso meio triste, porque quando você termina de refutar qualquer argumento que essa pessoa possa ter, ela passa a achar que você está sendo pedante e babaca. Eu já fiz um post sobre isso dizendo que você pode e deve ler livros para se divertir, o que não dá é só ficar nisso, e o que não dá MESMO é achar que isso é o supra-sumo da intelectualidade atual. Com tudo isso quero dizer que ler livro de youtuber não vai fazer ninguém melhor, sério mesmo. Nem esse papo de que criança começar a ler livro de youtuber serve, porque no mesmo post eu disse que não acredito em escada literária, e, além disso, para onde a pessoa vai depois de ler o que a Kéfera escreveu? A única alternativa que eu vejo é para outro livro de youtuber que ela gosta, até isso acabar. A não ser que tenha algum livro indicado lá, aí nós podemos ter alguma esperança.
Agora, sobre a questão das pessoas destratarem os youtubers por estarem lançando livros: esse povo eu odeio, a começar pelo baluarte dos ignorantes literários, Felipe Neto, que me vem fazer vídeo falando que livro é coisa sagrada e a história da literatura é algo maravilhoso e não sei mais o que, sendo que ele mesmo fez um idêntico a todos esses que estão aí, contando a vida dele durante a fama e todas essas bobeiras que pessoas de 20 anos fazem. Essas pessoas, assim como o dito cujo, acham que livro é uma parada sagrada, ser escritor é uma parada sagrada, tratam tudo isso como uma religião, e isso me dá nojo. Primeiro porque esse tipo de pensamento gera o tipo de pessoa que eu ilustrei no 6° tópico, onde o intelectual acha que Crepúsculo é desperdício de papel, mas Harry Potter é o cânone mais cânone dos últimos tempos, quando, numa comparação analisada, eles são a mesma coisa (agora esse blog vai a baixo). Segundo, e provavelmente o pior dos dois, é o elitista. Ô pessoa filha da puta. Odeio quem acha que eu não posso zoar os grandes autores porque isso é “falta de respeito”, principalmente quando são gente da zoeira forte como Fernando Pessoa e Jorge Luis Borges, escritores que eu amo aliás. Esse povo do “não me toque” que bota os clássicos num pedestal e chama todo mundo de burro e “só quem leu a obra completa do Herman Hesse é que é legal” e tudo mais são escória da literatura. Na minha opinião, são eles que fazem os grandes autores serem menos lidos, basicamente porque eles não são comunicativos, são muito ofensivos e querem manter todos esses autores desconhecidos, porque quem faz sucesso obviamente é ruim.
Eu acredito, e por isso faço esse blog do jeito que faço, que a literatura pesada tem sim jeito de ser popular, você só tem que saber falar dela. Se você se mantém com as portas fechadas refletindo com as mesmas três pessoas há 50 anos, você não é inteligente, porque a sua capacidade intelectual só serve para três indivíduos, para o resto o seu cérebro é tão importante quanto o do meu cachorro. Os autores querem ser lidos pelo público, porque pensar muda as pessoas e as enriquece espiritualmente. E no final esses caras que já não são comunicativos ainda acham que as outras pessoas também não podem e por isso odeiam quem faz isso, como os youtubers. Aí quando esse povo se mete no meio deles usando o papel para falar também, eles ficam loucos.
No final das contas o que eu quero dizer é: você pode criticar o quanto você quiser o conteúdo, ele ter sido feito por um ghostwriter e outras coisas, mas não a existência dele, porque você pode discordar de qualquer pessoa, mas não pode negar o direito dela de dizer coisas, e livros são uma forma de comunicação também, então só por conta disso dá para dizer que pessoas que não querem livros de youtubers nas prateleiras são, no mínimo, bem autoritárias.
Em tempo: youtuber não toma lugar de ninguém na literatura, aliás ninguém toma lugar de ninguém na literatura no sentido de publicação e público. Essa é uma questão de qualidade ou público, e os youtubers estão entrando por uma porta, se você quiser entrar nessa também, então escreva sobre algo da moda, fique famoso, ou faça literatura bem feita, espaço não vai faltar.
Eu não tenho nada contra livros de youtubers, já até quis ler o da Jout Jout, que fala sobre crises, e recentemente saiu o da Mandy Candy que, para quem não sabe, é uma mulher trans que usa o seu canal no youtube para falar, entre outras coisas, sobre seu processo de transição, assunto que ela também aborda no livro, ou seja, pode ser algo interessante e que ajude outras pessoas passando pela mesma situação que ela. Tá vendo? Não é apenas "minha vida durante a fama", "aquele dia que eu embebedei uma menina para dar uns beijos foi louco" ou "vou expor minha ex na internet contando como foi transar com ela e citarei nomes, mas na real a culpa foi do meu ghostwriter e eu dei mole em não revisar meu livro". Resumindo, nada contra, até leria alguns.
Algo que eu concordo com o Victor é que livro de youtuber é muito um produto direcionado a um público específico, acho que na maioria dos casos é mais produto do que qualquer outra coisa. Se você não gosta daquela personalidade e decide arriscar a leitura, pode dar errado, mas, se você é fã da pessoa, já é meio caminho andado ou mais. Compra quem quer, lê quem quer. É muito simples. Quando escrevem (alguns nem isso) esses livros, eles estão pensando na galera que assiste aos vídeos, a preocupação, acredito eu, é com esse pessoal. Então se você não faz parte dessa comunidade, assim... é aquele ditado.
É inegável. Esses novos autores estão vendendo HORRORES! E sabe para onde vai esse lucro? Eu acredito que para as editoras. Então assim, se a editora que você curte está ganhando rios de dinheiro com esse nicho, comemore, pois ela provavelmente não irá à falência tão cedo. Entendem o que eu quero dizer? Business...
O Victor deixou claro ali em cima que não acredita nessa ideia de que alguém possa iniciar o hábito da leitura com um livro de youtuber, eu discordo, acredito que seja possível. Sim, também creio que por algum tempo a pessoa permaneça nesse gênero pulando de youtuber a youtuber até o estoque acabar, mas pode ser que um dia ela se interesse em ler outras coisas, por que não?
Vocês devem ter reparado que algo muito discutido com o anúncio dos autores da Bienal foi o destaque que youtubers estavam recebendo. Pelo que me lembro, vi algo do tipo "outros autores não terão a atenção que merecem por conta dessa galera nova" e eu acho isso meio bizarro. Se eu acompanho o trabalho de um autor, sou fã do cara, tenho seus livros, por que raios eu deixaria de prestigiá-lo por conta, sei lá, do Christian Figueiredo por exemplo? Isso não existe. Não é uma questão de uma coisa ou outra. Mia Couto não está perdendo o seu espaço porque a Kéfera anunciou mais um livro. É só mais uma vertente do mercado literário.
E, por favor, parem de dizer que a literatura brasileira acabou por conta disso, sério, eu já li essa frase várias vezes em vários grupos diferentes. Se você acha que a literatura nacional está no fundo do poço, você não está procurando direitinho. Siga em frente, olhe para o lado (quem pegou?). Saia da bolha.