AUTOR: Rubem Fonseca
PUBLICAÇÃO ORIGINAL: 1998
ANO DA EDIÇÃO: 2014
EDITORA: Nova Fronteira
PÁGINAS: 144
A aparente razão da união desses contos é o seu assunto: as obras se dedicam a explorar e mostrar a hipocrisia e o absurdo da alta burguesia, assim como fizeram grandes artistas como Buñuel e Woody Allen. De festas granfinas a fazendas gigantescas, o universo das personagens apresentadas é sempre o dos sonhos de muita gente e com muito glamour, tudo armado pelo autor para mostrar o que tem de mais absurdo na alta sociedade brasileira e, pelo que eu já vi, a alta sociedade mundial.
O primeiro conto, Livre Arbítrio, já revela para mim um dos principais problemas da obra: o erro nas escolhas da forma de se contar a história. O conto é sobre um cara que ajuda as pessoas a se matarem, como uma forma de exercício máximo do livre arbítrio, que passa a trocar cartas com uma correspondente secreta contando sobre todos os casos e a maneira encontrada para executá-los sem ser pego. Além do fato de uma pessoa dar provas incriminadoras para um desconhecido, o conto é narrado apenas pelo que ele escreve para ela, ou seja, o que mocinha escreve não aparece, o que até estava dando certo se não fosse pela última carta que resume tudo o que foi dito pela moça, do contrário o conto não faria sentido. A ideia de você escrever uma carta repetindo tudo que a outra pessoa disse só por repetir me broxou muito, sendo essa mudança (botar a carta da moça como a ultima) tão fácil que eu não entendo como um escritor experiente pôde cometer um erro desses.
Outros contos não pecam, mas também não trazem nada incrível, como A Festa, onde uma socialite tem o azar de ter um morto no meio da festa de aniversário do seu marido tão bem produzida por ela. O Vendedor de Seguros traz um homem com vida dupla escrita de maneira bem rápida e direta, do jeito que eu gosto, mas não diz nada, é só uma ação estética esquecível.
Anjos das Marquises é um conto óbvio por natureza, que pela sua previsibilidade acaba perdendo a sua força, onde um velho aposentado sem nada para fazer da vida se apaixona por uma instituição que tira mendigos da rua e leva para um lugar que o velho desconhece, mas que ele quer ajudar por achar estar fazendo uma boa ação. AA é um conto de perspectiva boba e simplista, onde um fazendeiro recebe a visita de uma mulher que pretende averiguar as condições dos trabalhadores e da fazenda, e ele esconde um segredo horrível. O que poderia ser um grande conto é arruinado por conversas melosas e sentimentos baratos, e ainda há o erro de continuidade: algumas horas depois de chegar de avião à fazenda do protagonista, a mulher pergunta se eles têm ali uma pista de pouso.
A Maneira de Godard, o principal conto do livro por culpa do tamanho, cai no mesmo erro da forma que os outros. Contado em forma de teatro, a história narra o encontro do paleontólogo Romeu com a cientista contestadora Julieta, que no começo brigam constantemente por diferenças de pensamento, mas descobrem que ambos tem o mesmo problema: nojo da parte sexual oposta, embora não sejam homossexuais. Juntos eles tentam resolver esse problema enquanto discutem vários outros assuntos relacionados ou não com a profissão que exercem. O jeito escolhido pelo Rubem serviria para pôr em destaque os diálogos filosóficos que o autor queria tirar a partir do tema sexual, mas ele resolveu usar a conversa para os próprios personagens descreverem o que estão fazendo. Deus, quem em sã consciência toma um caminho desses na sua escrita?
Os últimos dois são A Confraria dos Espadas, que dá o titulo do livro e sem duvidas é o melhor (diria talvez o único realmente bom) onde um ex-membro da confraria conta a ascensão e queda desse clube de homens que tinham um único objetivo: conseguir gozar sem ejacular. Diria para vocês procurarem apenas esse conto, deve ter por aí nas internets, pois é uma reflexão interessante e engraçada. Já em Um Dia na Vida de Dois Pactários, temos um poema narrando a vida sexual intensa de duas pessoas, algo totalmente esquecível também.
No geral o projeto gráfico da Nova Fronteira está lindíssimo, com vários extras de textos falando sobre a obra do Rubem Fonseca e sobre o próprio livro. A capa maravilhosa foi o que me fez comprar o livro, uma mão de gesso perfeita demais com a iluminação e as cores certas. Infelizmente, a leitura foi uma grande decepção, mas ainda darei outra chance ao autor.