Por: Victor Heliângelo
NOITE DENTRO DA NOITE
AUTOR: Joca Reiners Terron
PUBLICAÇÃO ORIGINAL: 2017
ANO DA EDIÇÃO: 2017
EDITORA: Companhia das Letras
PÁGINAS: 464
*Exemplar cedido pela editora.
AUTOR: Joca Reiners Terron
PUBLICAÇÃO ORIGINAL: 2017
ANO DA EDIÇÃO: 2017
EDITORA: Companhia das Letras
PÁGINAS: 464
*Exemplar cedido pela editora.
Há uma lenda entre os literatos de que brasileiros não conseguem escrever calhamaços. Normalmente, eu defenderia o meu povo dizendo que é porque a gente se preocupa em escrever bem e não em encher linguiça, mas ultimamente nem isso se faz necessário mais, porque todos os grandes escritores estão começando a lançar grandes obras, graças a Deus, tanto em tamanho quanto em qualidade.
É o caso de Um defeito de cor, da Ana Maria Gonçalves, Uma fuga perfeita é sem volta, da Marcia Tiburi, e principalmente, Noite dentro da noite, de Joca Reiners Terron, um dos grandes escritores da atualidade. Joca é um dos escritores que vivem pela literatura: traduz, organiza coleções, dá workshops e oficinas, publica resenhas, tem um blog (um dos melhores para ler postagens antigas, mas ele não posta muito hoje em dia) e nesse meio tempo escreve grandes livros para gente.
Como sempre, sinopse primeiro: Este livro é sobre você, que bateu a cabeça aos 12 anos de idade e teve problemas neurológicos e esqueceu tudo o que tinha acontecido na sua vida. Curt Meyer-Clason, grande tradutor de vários latino-americanos para o alemão, conta sua história, falando sobre o Ano do Grande Branco, seus pais, a vida em Curva de Rio Sujo, o nazismo na America Latina, a planta vampiro, a pyhareryepypepyhare, a relação dos seus familiares com a ditadura militar e sobre quem realmente você é.
Já pela sinopse você pode sentir que o livro não é dos mais comuns. Joca narra o livro em segunda pessoa, algo que pouquíssimos escritores conseguiram fazer ao longo da história da literatura e, não satisfeito, ainda por cima é a experiência de maior fôlego do estilo (quase o dobro do tamanho de “Se um viajante numa noite de inverno...” de Italo Calvino). Apesar de ter citado Calvino, seu estilo de narração se aproxima mais dos livros de memórias de Paul Auster, onde o “você” está mais puxado para o próprio Joca do que para o leitor em si, principalmente pelo fato de que seus tios têm o sobrenome Reiners, mas o nome dos pais nunca aparece.
Joca abre o livro de um jeito impressionista, abusando de imagens superlativas, que vai ditar o tom dessa obra o tempo todo, ajudando muito a conferir o tom místico que muitos diriam ser típico de um escritor latino-americano, mas a negatividade no romance faz com que Terron se aproxime muito mais de um Roberto Bolaño do que de García Márquez, algo que ele mesmo chamou de “Niilismo Mágico”. Uma das marcas mais fortes dessa magia estranha é a mãe, chamada apenas de Rata e sempre identificada como uma rata humana, uma das melhores personagens que eu li nesse ano e uma das mais sofridas também, tendo que lidar constantemente com a perda das mais variadas formas possíveis.
O livro passa em diversos tempos diferentes, desde a chegada da irmã de Nietzsche ao Brasil em 1886 com o marido, passando pelo golpe militar no Brasil e a vida no interior no meio de uma ditadura militar. O protagonista tem a desconfiança de que ele na verdade é substituto de outra pessoa, um irmão secreto, e que o remédio que dão a ele para o problema na cabeça na verdade é uma droga que o mantém com falta de memória. Todos os estranhos acontecimentos, como o jeito que seus pais agem, as aparições de seus tios, a fuga de Medianeira assim que seu pai apareceu com o braço quebrado, entre outras coisas, fazem o protagonista desconfiar e investigar cada vez mais, ao mesmo tempo em que tem de lidar com os filhos dos militares que praticam um bullying pesadíssimo com ele apenas porque o acidente o tornou mudo.
O projeto gráfico é o padrão Companhia de sempre, a capa na verdade parece feita de um material mais emborrachado, e não de papel grosso como é a maioria. Eu gostei muito da escolha da capa, algo psicodélico e ao mesmo tempo bem representativo, o buraco com todas as linhas apontando e indo mais fundo, com a indicação de que você está entrando na Noite dentro da noite, talvez não pudesse ficar melhor. Fica a fortíssima recomendação de um dos melhores livros do ano com certeza.
É o caso de Um defeito de cor, da Ana Maria Gonçalves, Uma fuga perfeita é sem volta, da Marcia Tiburi, e principalmente, Noite dentro da noite, de Joca Reiners Terron, um dos grandes escritores da atualidade. Joca é um dos escritores que vivem pela literatura: traduz, organiza coleções, dá workshops e oficinas, publica resenhas, tem um blog (um dos melhores para ler postagens antigas, mas ele não posta muito hoje em dia) e nesse meio tempo escreve grandes livros para gente.
Como sempre, sinopse primeiro: Este livro é sobre você, que bateu a cabeça aos 12 anos de idade e teve problemas neurológicos e esqueceu tudo o que tinha acontecido na sua vida. Curt Meyer-Clason, grande tradutor de vários latino-americanos para o alemão, conta sua história, falando sobre o Ano do Grande Branco, seus pais, a vida em Curva de Rio Sujo, o nazismo na America Latina, a planta vampiro, a pyhareryepypepyhare, a relação dos seus familiares com a ditadura militar e sobre quem realmente você é.
Já pela sinopse você pode sentir que o livro não é dos mais comuns. Joca narra o livro em segunda pessoa, algo que pouquíssimos escritores conseguiram fazer ao longo da história da literatura e, não satisfeito, ainda por cima é a experiência de maior fôlego do estilo (quase o dobro do tamanho de “Se um viajante numa noite de inverno...” de Italo Calvino). Apesar de ter citado Calvino, seu estilo de narração se aproxima mais dos livros de memórias de Paul Auster, onde o “você” está mais puxado para o próprio Joca do que para o leitor em si, principalmente pelo fato de que seus tios têm o sobrenome Reiners, mas o nome dos pais nunca aparece.
Joca abre o livro de um jeito impressionista, abusando de imagens superlativas, que vai ditar o tom dessa obra o tempo todo, ajudando muito a conferir o tom místico que muitos diriam ser típico de um escritor latino-americano, mas a negatividade no romance faz com que Terron se aproxime muito mais de um Roberto Bolaño do que de García Márquez, algo que ele mesmo chamou de “Niilismo Mágico”. Uma das marcas mais fortes dessa magia estranha é a mãe, chamada apenas de Rata e sempre identificada como uma rata humana, uma das melhores personagens que eu li nesse ano e uma das mais sofridas também, tendo que lidar constantemente com a perda das mais variadas formas possíveis.
O livro passa em diversos tempos diferentes, desde a chegada da irmã de Nietzsche ao Brasil em 1886 com o marido, passando pelo golpe militar no Brasil e a vida no interior no meio de uma ditadura militar. O protagonista tem a desconfiança de que ele na verdade é substituto de outra pessoa, um irmão secreto, e que o remédio que dão a ele para o problema na cabeça na verdade é uma droga que o mantém com falta de memória. Todos os estranhos acontecimentos, como o jeito que seus pais agem, as aparições de seus tios, a fuga de Medianeira assim que seu pai apareceu com o braço quebrado, entre outras coisas, fazem o protagonista desconfiar e investigar cada vez mais, ao mesmo tempo em que tem de lidar com os filhos dos militares que praticam um bullying pesadíssimo com ele apenas porque o acidente o tornou mudo.
O projeto gráfico é o padrão Companhia de sempre, a capa na verdade parece feita de um material mais emborrachado, e não de papel grosso como é a maioria. Eu gostei muito da escolha da capa, algo psicodélico e ao mesmo tempo bem representativo, o buraco com todas as linhas apontando e indo mais fundo, com a indicação de que você está entrando na Noite dentro da noite, talvez não pudesse ficar melhor. Fica a fortíssima recomendação de um dos melhores livros do ano com certeza.