AUTOR: Julio Cortázar
ANO DE PUBLICAÇÃO: 1995
ANO DA EDIÇÃO: 2015
EDITORA: Civilização Brasileira
PÁGINAS: 240
Acontece que eu caguei para o pessoal do “país natal” (Julinho nasceu na Bélgica) do mestre da fantasia latino-americana. Podem dizer que ele é leitura para adolescente (só tenho 20 anos mesmo), que ele não tem nem um décimo do talento do Borges (há controvérsias, principalmente aqui no Brasil) e que sua obra não resiste a uma releitura, o que é engraçado porque tive uma vontade imediata de relê-lo, mas eu tenho que manter um blog e não dá para ficar de bobeira por aí. Só para terminar o argumento, Roberto Bolaño em sua última entrevista disse que O Jogo da Amarelinha está entre os 5 melhores livros que ele já leu, e que todo escritor de contos TEM que ler Cortázar, so I rest my case (pesquisem e vamos discutir sobre isso).
Porém, eu acho que o livro em questão não tem nada a ver com o que se discute acerca da sua qualidade literária, principalmente contos e romances. “Adeus Robinson” reúne quatro peças do grande escritor argentino, campo em que ele trabalhou muito pouco, mas muito bem. As duas primeiras têm o mesmo nome: Dois Jogos de Palavras,com subtítulos diferentes, Peça em Três Cenas e A Temporada das Pipas, respectivamente. A terceira se chama Nada Para Pehuajó e a última é a peça radiofônica que dá nome ao livro.
As duas primeiras possuem o mesmo tema, e talvez por isso o mesmo nome, apesar de partirem de pontos completamente diferentes. Na primeira, uma moça prestes a se casar procura seu passado e um antigo amante para confrontá-lo com o seu futuro. Enquanto na segunda uma casa gigante na fazenda abriga inquilinos que nunca precisaram pagar a estadia ou ajudar em trabalho algum, mas o dono do lugar está prestes a mandar embora um rapaz que os outros julgavam ser o preferido dele. Ambas têm vários pontos em comum, como o tom de surreal, algo inspirado no teatro do absurdo de Beckett e Ionesco; a aparente falta de sentido em quase todos os diálogos, típico do jogo literário proposto por Cortázar em quase toda a sua obra; o tema das escolhas que fazemos nas nossas vidas e poder das palavras dentro delas, seja em forma falada ou escrita.
A terceira peça é a minha preferida, mas acredito que seja só eu mesmo que goste mais dela do que da última, principalmente pelo fato de ser muito doida. Trata-se de um restaurante no horário mais movimentado, e nele vemos pessoas de diferentes classes sociais e áreas de trabalho envolvidas numa discussão de um casal, enquanto aparentemente dois personagens jogam ou manipulam lá dentro, que seriam o Caixa e o Homem de Branco. A peça fala principalmente de como somos manipulados por certas pessoas com muita facilidade e várias das técnicas usadas por esses indivíduos poderosos para não nos deixar focar no verdadeiro problema.
A última peça já me interessava pelo fato de não ser uma peça convencional, mas sim feita para o rádio, e foi interessante ver o que mudava na sua escrita, principalmente pelo fato de não haver indicações de movimento ou ambientações, e sim sons que o rádio faria para a narrativa da peça andar, e, claro, um texto ainda mais focado no diálogo. Aqui teremos spoiler do clássico Robinson Crusoe, então, caso você seja spoilerfóbico como eu, pule para o próximo parágrafo. A história conta a volta do famoso Robinson Crusoe e seu parceiro de sobrevivência Sexta-Feira à ilha em que quase morreu, agora totalmente urbanizada e pronta para recebê-lo da melhor maneira possível, porém Crusoe está prestes a descobrir que existe mais de um tipo de solidão. O texto, diferente dos outros, é totalmente direto ao ponto e sem complicações estilísticas, onde Cortázar parte para um nocaute no leitor e fala sobre a isolação do ser humano no meio da sociedade, tema extremamente atual até hoje.
O projeto gráfico da Civilização Brasileira está ótimo, adoro a padronização de capas nos autores, e do Cortázar tem uma muito própria que dá para reconhecer como dele de longe, mas a desse livro é a que eu menos gosto por causa da combinação de cores, para mim verde e roxo não dão certo (na verdade não gosto de quase nada com verde, mas essa combinação é de matar). Dentro do livro a letra é maior do que eu estou acostumado (as edições da Companhia têm letra padronizada e a desse é bem maiorzinha), o espaçamento é bom e a aquisição desse livro é recomendadíssima.